A Veracidade nas Relações Humanas

Opinião de Diamantino Bártolo
0
1197

Devo começar por dizer que as Relações Humanas interpessoais, no domínio do diálogo, são extremamente complexas porque, apesar de se utilizar, por exemplo, o mesmo código linguístico verbal, este, ainda assim, normalmente, é acompanhado por uma linguagem não-verbal, muito significativa, que tanto pode confirmar o que estamos dizendo, como contrariar o nosso discurso, ou seja: a lealdade que tem subjacente a verdade, pode ser atraiçoada por quaisquer gestos, voluntários, ou não controlados, que transmitem, precisamente, o inverso do que se afirma.

As Relações Humanas, consideradas no contexto do relacionamento interpessoal coerente, aqui no domínio do diálogo, dos sentimentos e das emoções, que caraterizam uma determinada personalidade que, por sua vez, implica um comportamento relativamente equilibrado, serão possíveis de se exercer com total lealdade, abertura e transparência, perante o interlocutor?

A lealdade é um valor que exige, por parte de quem a pretende exercer, grande rigor, uma confiança total no outro, posta a toda a prova, nas mais diversas circunstâncias, a confirmação, ou não, de reciprocidade, por parte de quem, em quem se confia totalmente, uma certa intimidade no sentido de haver cumplicidade entre as pessoas que se desejam relacionar com sinceridade, abertura de espírito, comunhão de princípios, valores, desejos e projetos.

Pode-se estabelecer um paralelo entre lealdade e assertividade nas Relações Humanas ao nível das relações interpessoais e ao refletirmos neste âmbito, então deparam-se grandes dificuldades, designadamente em certas entidades, em que a sinceridade dos diálogos verbal e não verbal ficará muito aquém do minimamente exigível: certo tipo de jogos, negócios, política, concursos, relações de trabalho, na própria família, ou seja: a lealdade nestes relacionamentos, ao longo da vida, poderá, de quando em vez, ser seriamente prejudicada.

Costuma-se dizer que: “O segredo é a alma do negócio”. Tudo indica que sim, porque a sociedade atual, por razões diversas, algumas alheias à própria vontade das pessoas, tem vindo a ignorar certos princípios e valores, e até sentimentos, para conseguir atingir objetivos, normalmente materiais, sociais e estatutários que, pela via da sinceridade, e do mérito próprio, jamais alcançariam.

Hoje, praticamente, em certas circunstâncias, vale tudo, e neste vale tudo, a inverdade, a omissão, a hipocrisia, entre outros comportamentos, subsistem, prejudicando o bom relacionamento que é essencial para uma boa convivência entre as pessoas. Enquanto não houver sinceridade no diálogo e coerência entre este e o pensamento, as Relações Humanas leais vão ser sempre muito difíceis.

Do exposto acima, que na minha perspetiva corresponde um pouco ao que se passa na sociedade, não se pode inferir, porém, que eu não defenda a maior lealdade possível nas Relações Humanas e, como orientador na área da educação, defendo a verdade como valor essencial na formação das nossas crianças, jovens e adultos, sim, porque hoje o conceito é o de aprender ao longo da vida, portanto, todos estamos envolvidos na defesa da sinceridade nas nossas relações interpessoais.

É essencial termos sempre a noção de que a mentira, e até mesmo a omissão, normalmente conduzem à desconfiança, ao descrédito, ao conflito que, no seio das famílias, por exemplo, entre cônjuges, revela-se de consequências imprevisíveis, como o vexame, a nódoa e o aproveitamento calunioso que acaba por recair não só no casal, como nos filhos e parentes mais próximos. A deslealdade no matrimónio, de facto, pode provocar efeitos passionais que, em certas situações, destroem toda uma vida, um passado de amor e termina com a morte, quantas vezes violenta, de quem traiu e, não raro, dos cônjuges e filhos.

Naturalmente que não há pessoas perfeitas, projetos ideais, objetivos totalmente conseguidos e, quando assim acontece, várias podem ser as causas, nestas se incluindo, também, e eventualmente, a deslealdade, por exemplo, entre: sócios de uma empresa; colegas de trabalho; patrões e trabalhadores; estudantes e professores; concorrentes a um emprego, mas, o importante, no meio de tantas lacunas, que cada pessoa possui, tudo se deve fazer para evitar ao máximo o recurso à inverdade, à omissão.

Pretendo com esta reflexão dar um modesto contributo ao meu livro, ao qual  resolvi dar o título, muito atual e preocupante: “Lealdade nas Relações Humanas”, e que eu penso ter fortíssimos e verdadeiros fundamentos, porque me conheço muito bem e sei que nunca uso a mentira, nem com os seus adversários, embora já tenha sido vítima da deslealdade, até de pessoas a quem tanto tenho apoiado e que hoje, “mudam de passeio” Quando me veem, ou, ainda pior deixaram de comigo se relacionar sob qualquer forma ou meio.

Ao longo da minha vida, muitas foram as pessoas por mim ajudadas: seja no contexto da docência, nos níveis secundário e superior; formação profissional; apoio integral na política; no quadro da atividade policial; ainda, a pessoas com dificuldades financeiras, etc., estive sempre com verdade, com entusiasmo, dando apoio incondicional, em algumas situações. Hoje, muitas dessas pessoas, pensam que já não precisam de quem as auxiliou, até nos momentos mais difíceis das vidas delas. Mas nesta vida, “há sempre uma esquina” onde as pessoas, inesperadamente, se encontram.

A verdade, como muito bem refere a sabedoria popular, é como o azeite: “vem sempre à superfície/tona da água”, por isso ela deveria ser permanentemente a regra, o princípio, o valor intransigente nas nossas Relações Humanas. A lealdade arrasta para o consenso, tudo o que há de bom na pessoa verdadeiramente humana.

A lealdade nas Relações Humanas dignifica quem a utiliza, inspira confiança e adesão aos princípios, valores, sentimentos e emoções, porque tudo é verdadeiro, tudo é sincero e as pessoas acabam por construir autênticos laços de amizade, de solidariedade e de gratidão, logo, todo o relacionamento fica muito mais facilitado.