Documentos Fundamentais dos Direitos Humanos

Opinião de Diamantino Bártolo
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A Revolução Social Francesa de 1789, deverá, sem quaisquer complexos para os restantes povos, constituir uma bússola, um farol, uma referência, quando e sempre que se pretender invocar a História dos Direitos Humanos, independentemente das eventuais e compreensíveis insinuações que se possam defender, quanto à natureza ocidentalizada dos valores e princípios consagrados mais tarde na Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas em 10 de Dezembro de 1948. Foi justamente há setenta e cinco anos (1948-2023)

O Preâmbulo da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 26 de Agosto de 1789 é, por si só, um marco fundamental do pensamento da comunidade francesa da época: «Os representantes do povo francês, constituídos em Assembleia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo pelos direitos do homem são as únicas causas das desgraças públicas e da corrupção dos governos, resolvem expor, numa declaração solene, os direitos naturais inalienáveis e sagrados do homem, (…) para que os actos do poder legislativo e do poder executivo (…) sejam mais respeitados; para que as reclamações dos cidadãos, baseadas a partir de agora em princípios simples e incontestáveis visem sempre a defesa da constituição e a felicidade de todos.» (in: HAARSCHER, 1997:167)

Desde logo se destaca uma referência aos Direitos Naturais do homem e verifica-se ao longo dos poucos, mas muito densos e significantes artigos da Declaração, a necessidade imperiosa de divulgar, promover e defender todo um conjunto de Direitos e Liberdades que, hoje, continuam a ser considerados valores supremos, absolutos, que não deveriam ser violados, em circunstância alguma.

Por razões de ordem didática, seja permitido destacar alguns Direitos consignados noutros tantos artigos da Declaração: «Artº 1º – Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem ser fundamentadas na utilidade comum. Artº 2º- O fim de toda a associação política é a conservação dos Direitos Naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são: a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão. (…) Artº 4º – A liberdade consiste em poder fazer tudo o que não seja prejudicial a outrem: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem só tem por limites os que garantam aos outros membros da sociedade o gozo desses mesmos direitos. Esses limites só podem ser determinados por lei. Artº 5º – A lei tem por único direito a proibição das acções nocivas à sociedade. Tudo o que não é proibido por lei não pode ser impedido, e ninguém pode ser obrigado a fazer o que ela não ordena. Artº 6º – A lei é a expressão da vontade geral. (…). Ela deve ser a mesma para todos, quer seja para proteger, quer seja para punir.» (in: Ibi.:168)

Obviamente que se se analisar os documentos: A Declaração (Francesa) dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 e a Declaração Universal dos Direitos Humanos aprovada pela Assembleia Geral da ONU (organização das Nações Unidas) em 1948, detetam-se flagrantes diferenças, na medida em que, enquanto na primeira apenas se defendem valores que integram direitos naturais, imprescritíveis, ou seja, direitos da primeira geração; na segunda, aprovada, decorridos que foram mais de cento e cinquenta e nove anos, já se verifica uma evolução, para melhor, onde se incorporam novos valores e os correlativos direitos, nomeadamente Económicos, Sociais e Culturais, entre outros, que, numa taxinomia clássica, designam-se por direitos de Segunda e Terceira gerações. Ainda bem que assim aconteceu, todavia, nem tudo está bem, há que reconhecê-lo.

A evolução que se regista na aplicação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, e que interessa ao presente trabalho, relaciona-se, numa determinada perspectiva, com a educação, e de facto, existe esta preocupação: «Artº 26º – 1.) Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos no que respeita ao ensino elementar e fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional devem ser generalizados; o acesso aos estudos superiores deve ser aberto em plena igualdade a todos em função do seu mérito. 2.) A educação deve visar o pleno desenvolvimento da personalidade humana e o reforço do respeito pelos direitos do homem e liberdades fundamentais. Deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, assim como o desenvolvimento das actividades das Nações Unidas pela manutenção da paz.» (in: Ibid.:174)

Entretanto, os portugueses têm motivos para estarem razoavelmente satisfeitos, na medida em que, no período compreendido entre a publicação dos dois importantes documentos, anteriormente citados, o sistema educativo, revela, no âmbito do “ensino” da Filosofia, preocupações idênticas sobre a problemática dos Direitos Humanos Naturais, verificando-se inequivocamente que, apesar da posição dominante em relação às suas então colónias, Portugal vinha acolhendo no seu sistema educativo os grandes princípios e valores pelos quais se deve reger uma sociedade organizada.

Naturalmente que: no período colonial se cometeram muitos erros em matéria de Direitos Humanos; é conhecida a situação que atravessou grande parte da idade medieval por motivos religiosos; não se escondem a escravatura nem outras violações, durante certos períodos da história lusíada coletiva, obviamente porque, também, as mentalidades eram outras; como por outro lado, é justo afirmar que existem sérios esforços no sentido de melhorar os comportamentos, face à necessidade imperativa de salvaguarda dos Direitos Humanos.

Bibliografia

HAARSCHER, Guy, (1993). A Filosofia dos Direitos do Homem. Tradução, Armando F. Silva. Lisboa: Instituto Piaget.

ONU-ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (1948). Declaração Universal dos Direitos do Homem, Lisboa: Amnistia Internacional, Secção Portuguesa, 1998;