O Homem: um ser limitado

Opinião de Diamantino Bártolo
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Refletir, elaborar e aplicar um “Código de Moralidade” está ausente dos objetivos do presente trabalho e das preocupações do seu autor, porque: incongruente com a natureza humana, em geral; inexequível para o autor, em particular. Reconhecer a incapacidade para assumir uma prática sistemática, traduzida num comportamento moralista, assente na honestidade absoluta, nas tradições dos alegados bons-costumes, na moral e pudor públicos, entre outras posturas, é por si só um ato corajoso, embora incompreensível e criticável pelos puristas, moralistas e perfecionistas, porque atingir valores absolutos, provavelmente, ainda não é uma faculdade humana, fisicamente considerada, estando reservado a entes espiritualmente divinizados e, obviamente, ao próprio Deus.

A incapacidade para o homem alcançar os absolutos não significa, de modo algum, uma situação de total relativismo, porque dentro das limitações humanas, existem situações, princípios, valores, sentimentos, emoções, deveres e direitos que não devem ser relativizados, de contrário, duvidar-se-ia das realizações que a ciência, o conhecimento, a técnica e os resultados concretos, têm revelado ao homem; este duvidaria, no limite, da sua própria existência.  

O que se pretende alertar é para a precariedade da espécie humana, com o dramatismo que lhe é dado viver, justamente por conhecer as suas próprias insuficiências e limitações concretas. Afigura-se, portanto, difícil, afirmar que uma determinada pessoa é, absolutamente, ética, moral, honesta, perfeita ou qualquer outro atributo sublime. Decididamente, o autor desta reflexão, não o é.

Com efeito: «A natureza humana apresenta-se idêntica em todos os homens, que se podem considerar todos como membros da humanidade e como indivíduos formar parte de grupos sociais, relacionando-se uns com os outros e com o todo, como partes subordinadas, portanto ao conjunto. Mas pela sua qualidade espiritual, apresentam, cada um, carácter de totalidade que é o estatuto de pessoa, pelo qual subordinam a si todas as outras realidades como meios ao fim e como possuído a possuidor.» (SILVA, 1966:59).

Que alguma pessoa se possa arrogar o direito de ser, enquanto pessoa humana, superior a outra, parece uma atitude incorreta, desfasada da realidade que é dado verificar, pelo estado do conhecimento atual a que foi possível chegar. Qualquer comportamento xenófobo, etnocêntrico, racista, narcisista, isto é, discriminatório, constitui um retrocesso e um perigo para a construção de uma sociedade humana, digna dos indivíduos que a compõem.

Naturalmente que cada indivíduo é uno, indivisível, constitui uma singular personalidade, é irrepetível e infalsificável. A riqueza da sociedade humana reside nesta multipluralidade de indivíduos que, utilizando o jargão popular, por ser simples e compreensível, se pode consubstanciar na fórmula: “todos iguais, todos diferentes”, o que significa, todos com idêntica dignidade, mas também todos com as suas características próprias e únicas.

Hoje, nenhum ser humano consegue viver isolado, porque ele próprio vem edificando uma sociedade que, seguramente, deseja cada vez mais harmoniosa, mais justa, mais segura, mais fraterna. Em bom rigor: «A reconstrução de laços sociais verdadeiramente inclusivos e democráticos exige-nos uma prática renovada de escuta, abertura e diálogo, e inclusivamente de convivência com outras tendências, sem por isso deixar de priorizar o amor, que deve ser sempre o distintivo das nossas comunidades.» (BERGOGLIO, 2013:115).

Bibliografia

SILVA, A., S.J. (1966). Filosofia Social, Évora: Instituto de Estudos Superiores de Évora.

BERGOGLIO, Jorge, Papa Francisco, (2013). O Verdadeiro Poder é Servir. Por uma Igreja mais humilde. Um novo compromisso de fé e de renovação social. Tradução de Maria João Vieira /Coord.), Ângelo Santana, Margarida Mata Pereira. Braga: Publito.