BOA VIAGEM SRA. MINISTRA DO MAR

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O processo de nova dragagem do Portinho de Vila Praia de Âncora está avaliado em 1,5 milhões de euros, segundo anunciado em Lisboa no passado dia 8 de Maio de 2019 pela ministra do Mar, Ana Vitorino. 

A Polis Litoral Norte terá já lançado o concurso, segundo notícia vinda a público, sendo a responsabilidade da sua execução da competência da DGRM (Direção- Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos) .

A ministra do Mar após a terceira ronda de intervenções dos grupos parlamentares sublinhou que, “ tendo em conta a orientação da costa “ a situação dos pequenos portos está sujeita a assoreamentos e consequentes operações de desassoreamento. 

Parece que nestas coisas basta ter uma língua e saber fazer uso dela.  Não é preciso mais nada. Fiquei sem perceber a que ponto ou pontos da costa, concretamente,  a ministra se referia: se à nossa enseada, se a toda a costa ocidental do país, ou se à costa do Algarve. Mas, penso que generalizou. E os deputados deixaram passar este pormenor? Adiante!

Relativamente às causas do assoreamento do Portinho Ancorense, as causas são sobejamente conhecidas e não se enquadra nas generalidades da sra. Ministra do Mar. As causas são específicas e não têm a ver com a posição e contorno específico da nossa costa local. Há uma deriva sedimentar distinta de outros pontos da costa portuguesa que, normalmente, são de norte para sul e daí a orientação dos quebra-mar norte terem um sentido aproximado de nordeste para sudoeste em quase todos os portos da costa ocidental. Mas aqui, junto à praia, a deriva sedimentar segue de sul para norte ao longo da enseada, potenciada ainda pelo rio Âncora cuja corrente alinha com a direção dessa deriva, e segue em direção à embocadura do porto para dentro da bacia como se fosse uma grande bocarra aberta a receber toda a areia que esta deriva transporta.

Portinho de Vila Praia de Âncora

Por isso acuso pela enésima vez a incompetência manifesta dos técnicos envolvidos nos estudos prévios e na execução do projeto, mas também dos responsáveis políticos que lançaram a obra e que deu neste erro colossal e no grande desperdício do erário público. Mais, esta obra resultou no canto de cisne das pescas em Vila Praia de Âncora, porque nenhum pescador pode contar com a eficácia deste porto de abrigo, inseguro e permanentemente assoreado. E isto leva ao desencanto e à desmobilização. 

Aqui, traçaram a orientação dos molhes de forma generalizada e não tiveram em conta a particularidade da deriva sedimentar da enseada de sul para norte. Foi um traço a esmo como se as condições aqui fossem iguais às dos outros portos em que as correntes são de norte para sul.  Mas ainda mais agravado, porque a orientação do quebra-mar norte não segue sequer para sudoeste mas, ainda mais gravoso, para sulsueste bem em direção à praia. Um absurdo total. Porque neste local, a orientação mais eficaz seria oeste- sudoeste. E o contra- molhe não podia terminar na direção noroeste, mas em colher para sul para que a areia proveniente da praia  retornasse à praia e não para dentro da bacia do porto.

Para a maioria das pessoas que não estão atentas a todo este processo, às promessas eleitorais, às visitas de ministros e secretários de estado, personalidades que por aqui têm passado, facilmente se esquecem do que disseram e do que prometeram. Vamos lá a ver! Estou lembrado que a dra. Ana Vitorino, então secretária de Estado dos Assuntos do Mar, visitou o Portinho no tempo da dra. Júlia Paula então, presidente da Câmara Municipal de Caminha. O encontro foi no Forte da Lagarteira. Não vou agora usar os meus apontamentos desse encontro, que teria de revolver entre os meus papéis, e neste momento não posso perder tempo a fazê-lo. Sirvo-me da memória, para já. E, nesse encontro no forte da Lagarteira, a dra. Ana Vitorino – que até teve uma pequena controvérsia com a então presidente da Câmara – concordou que, em face da situação permanente de assoreamento do porto, se iria estudar uma intervenção de fundo para solucionar definitivamente o problema. É que, com todas as operações de dragagem e cada vez mais caras, até já era tempo de encontrar uma outra solução, talvez mais a norte, no sítio das Camboas.

Portinho de Vila Praia de Âncora

Pergunto: alguém sabe de algum estudo nesse sentido? Se o leitor não sabe, eu também não pelo que concluo, que não existe nem nunca existiu qualquer intenção de o levar a efeito. Mais uma treta a juntar a outras, porque o que a sra. Ministra do Mar nos traz agora é mais uma ilusão, uma espécie de comprimido que não faz nada, um placebo que não melhora o doente e apenas o ilude. Esta promessa da então secretária de Estado na altura agradou, tal como o placebo, mas não passou disso. O tempo passou e tenho a certeza que a maioria das pessoas presentes até já se esqueceu.

Agora, a mesma dra. Ana Vitorino, investida como ministra do Mar, traz-nos um novo placebo com o mesmo efeito, nulo. Porque depois deste desassoreamento outro e outros se seguirão até que alguém acorde e responsavelmente diga: – Basta! 

E das duas uma: Ou se avança para a tão almejada alternativa de uma intervenção de fundo, ou se abandona de vez este processo que não leva a lado nenhum, só ilude um momento e depois volta tudo ao mesmo. Aliás, acredito que já ninguém acredita nestas soluções de dragagens quando se sabe que se vão repetir, porque não se leva a sério o problema fundamental em vista a uma solução definitiva. E era possível, se houvesse vontade política. 

Em conclusão, a sra. Ministra do Mar está enganada, mal assessorada e mal informada em termos de querer resolver de vez o problema desta comunidade. E devia saber e conhecer que cada situação dos portos da costa portuguesa não são todos iguais, ou não têm a mesma procedência e, consequentemente, a exigência de uma mesma solução. Cada caso é um caso e não uma generalidade. 

Dragagem do Portinho é um placebo, um momento de ilusão, mas não vai mudar nada no fundo. Uma ilusão não se mantem muito tempo. A realidade impõe-se sempre. Mas como não querem resolver o problema em definitivo – e era possível – continuará tudo na mesma. E o erário público a pagar esta panaceia, cujo efeito passa logo. E, sendo assim: Boa viagem sra. Ministra do Mar.