Gestão Solidária com Regras de Boas-Práticas

Opinião de Diamantino Bártolo
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A intervenção direta do Poder Local Democrático, quer ao nível da Freguesia, quer ao nível do Município, junto das respetivas populações, pode assumir diversas vertentes, de harmonia com os setores de atividade económica, os estratos sociais, as situações individuais, familiares, grupais e comunitárias e, também, em função das carências que, em cada momento, se colocam.

Gerir a intervenção, administrar os meios e avaliar os resultados, são tarefas para as quais é conveniente haver preparação, não só pela experiência, como, principalmente, e também, pelo conhecimento das realidades locais, a que acresce, sensibilidade para querer participar na resolução dos correspondentes problemas.

A gestão autárquica solidária consiste, genericamente, em administrar os recursos disponíveis, em função dos interesses comunitários, acudindo, em primeira instância, às situações que, diretamente, afetam as pessoas mais carenciadas. Nesta linha se defende, por exemplo, em relação às Freguesias rurais que: «O Poder Local é uma forma de Governo Local, logo, de cariz comunitário, cujo objectivo é pugnar pelos interesses de um determinado colectivo, com alguma forma de organização administrativa, ainda que rudimentar.» (DIAS, 2002:11).

Administrar, equilibradamente, os recursos da autarquia, poderá significar uma aplicação racional, mas também técnica, dos bens disponíveis, em benefício daquelas intervenções que, à partida, se tem um mínimo de certeza, que vão melhorar as condições de vida de toda uma comunidade, acorrendo às situações que clamam soluções urgentes, que resolvem problemas verdadeiramente humanos. Para que as intervenções autárquicas sejam sustentadas e regulares, porém, sempre de forma positivamente exponencial, é necessário distinguir: o fundamental, do normal, do acessório, do casuístico e do supérfluo.

É essencial: tudo o que respeita à satisfação das necessidades básicas e correspondente à melhoria da qualidade de vida dos cidadãos; é normal, e/ou de rotina, tudo o que concerne à manutenção do que já foi adquirido, realizado e melhorado; é acessório, tudo o que poderá complementar o que é essencial, mas não é urgente nem importante; é casuístico, tudo o que, imprevisivelmente, surge e é necessário resolver, para não prejudicar o bem-estar da comunidade; é supérfluo, tudo o que em nada contribui para o benefício e bem-estar da comunidade.

Naturalmente que, dada a elevada quantidade, e a diversificada qualidade das intervenções do Poder Local Autárquico, é justo, e benéfico, que não se descurem algumas manifestações culturais, de lazer, ocupação dos tempos livres, entre outras.

A ideia de gestão solidária cabe, perfeitamente, no conceito constitucional, relativamente à função da autarquia: «As Autarquias Locais são pessoas colectivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas.» (CRP, Versão de 2004:87, Artº 235º)

 Solidariedade: não só como um valor imaterial, mas aqui como uma regra de boas-práticas, ao serviço do interesse coletivo da autarquia, em primeiro lugar; sem menosprezo pela cooperação com outras autarquias, instituições públicas e privadas, grupos de individualidades de fora do espaço geográfico autárquico, onde se insere a comunidade, cujos interesses se procura defender; isto é, em circunstâncias de normalidade, investe-se, redistribui-se, dão-se as oportunidades aos residentes na área da autarquia, no âmbito da intervenção.

 O critério residência, é importante no combate à desertificação, obviamente, sempre com observância dos normativos legais, contra a discriminação, excecionalmente, salvaguardando-se, também, as grandes catástrofes nacionais, internacionais e as correspondentes ajudas humanitárias, independentemente da localização, e da ideologia política da autarquia atingida.

Consideram-se, ainda, outras situações de manifesta carência, sistemática em autarquias de fracos recursos e populações pobres, perante as quais importa desenvolver ações de solidariedade, sob a forma de apoios materiais, concretos e significativos.

O autarca, enquanto gestor, tem responsabilidades acrescidas, porque: implica envolvimento direto na governação, na distribuição de recursos pela população, na preocupação constante pelo bem-comum da comunidade em geral, que nele confiou e o elegeu, sem exceções, nem discriminações negativas; mas também pelo bem-estar de cada família, de cada pessoa; as suas funções executivas vão para além da retórica politico-ideológica, do discurso comiceiro eleitoralista, e da demagogia popular enganosa.

O autarca, no exercício nas suas funções executivas: tem o dever de governar bem, para todos e sem discriminações negativas; solidarizando-se, incondicionalmente, em tempo útil, com os mais carenciados, desprotegidos e fracos, disponibilizando-lhes os recursos suficientes, para viverem dignamente.

Administrar a autarquia, enquanto conceito de bom e solidário governo, revela-se como um serviço público de grande alcance social, um verdadeiro apostolado: «Governar é uma responsabilidade gravíssima, porque implica o zelo das vidas, dos bens, dos interesses respeitáveis dos governados, tanto quanto à sua feição presente como aos desenvolvimentos futuros.» (CAETANO, 1974:69). 

Governar a autarquia, com a preocupação focada no bem-comum da população e dos seus haveres, no presente e para o futuro, implica total disponibilização, competência e sensibilidade social, entre outras capacidades e sentimentos. Envolve cidadãos com princípios, valores, sentimentos, emoções e comportamentos solidários, que se projetam para além das intervenções circunstanciais, eventualmente, eivadas daquele tipo de piedade, nem sempre bem compreendida. 

Bibliografia

CAETANO, Marcelo. (1974). Depoimento, Rio de Janeiro: Distribuidora Record de Serviços de Imprensa, S.A. Pág. 125.

CRP, (2004). Constituição da República Portuguesa, Versão de 2004, Porto: Porto Editora.

DIAS, José António Rajani Oliveira, (2002). Cartilha do Eleito Local. Odivelas: Jornal “Nova Odivelas”. Inclui: Lei Nº 169/99 de 18 de setembro – Comentada (Com a redação das alterações introduzidas pela Lei Nº 5-A/2002 de 11 de janeiro)